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Sem observar condicionantes da ADPF 828, juiz determina despejo de famílias agricultoras acampadas em Catalão (GO)

Por CPT Goiás

Juiz da 2ª Vara Cível de Catalão (GO) deferiu liminar de reintegração de posse contra comunidade do Acampamento Oziel Alves Pereira, na zona rural do município, nessa quarta-feira, 30 de novembro. A decisão foi deferida sem observar todas as condicionantes estabelecidas pelo Supremo Tribunal Federal para a retomada dos despejos após período de suspensão legal das ações desta natureza devido à Pandemia de COVID 19. 

O despacho foi enviado para a Comissão de Conflitos Fundiários criada no Tribunal de Justiça de Goiás, que deve se manifestar sobre a determinação. Sem participação do Ministério Público e da Defensoria Pública, sem audiência de mediação ou inspeção judicial, como determina o regime de transição da ADPF 828, a decisão retira das famílias seu direito à defesa, à segurança e à dignidade no processo de desocupação. 

A comunidade é composta atualmente por famílias agricultoras, fruticultoras e criadoras de animais de pequeno e grande porte, que produzem tanto em áreas familiares como em áreas coletivas. Esse ano, em apenas um projeto de lavouras comunitárias de transição agroecológica, foram plantados 2 hectares de mandioca, milho e feijão caiano. 

Neste trabalho, além da mão de obra, foram investidos recursos em adubo, sementes e horas de trator. Caso o despejo se efetive, as famílias podem perder toda sua produção. 


NÃO É A PRIMEIRA VEZ QUE O ACAMPAMENTO OZIEL ALVES SOFRE AMEAÇA DE DESPEJO


Em outubro de 2020, a comunidade resistiu a uma primeira tentativa arbitrária e truculenta de remoção. Em plena pandemia, a Polícia Militar invadiu o acampamento e derrubou as casas de duas famílias, sem que as pessoas tivessem chance de defesa, desconhecendo inclusive a existência do processo de reintegração de posse. Na ocasião, a liminar dava a posse da terra ao Banco do Brasil contra o antigo proprietário, que havia deixado a fazenda como garantia de empréstimo realizado no anos 1980 e nunca pago.

O banco  iniciou a reivindicação da terra como pagamento da dívida em 2010 e, a partir de solicitação feita pelo INCRA em 2018, iniciaram-se as tratativas para a destinação do latifúndio para o Programa Nacional de Reforma Agrária. Com a eleição de Jair Bolsonaro e a paralização total do programa pelo governo federal, a instituição financeira colocou a fazenda a leilão.

Cabe ao poder público, neste momento, garantir a segurança física e a dignidade das famílias que trabalharam para garantir seu alimento, dando função social e garantindo proteção ambiental a uma terra improdutiva e degradada por anos. Além de produzir para sua subsistência, a comunidade do Acampamento Oziel Alves Pereira realizou ações de solidariedade contra a fome na cidade ao longo do período de pandemia, distribuindo gratuitamente alimentos para famílias vulneráveis.

O QUE DIZEM AS CONDICIONANTES DA ADPF?

Após quase um ano e meio de suspensão legal das desocupações, com base na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 828, Supremo Tribunal Federal referendou decisão do ministro Luís Roberto Barroso, que determinou um regime de transição para a retomada dos despejos por ação judicial. Esse regime de transição determinou que:

“1. Tribunais de Justiça e Tribunais Regionais Federais devem instalar, imediatamente, comissões de conflitos fundiários que sirvam de apoio aos juízes. De início, as comissões precisam elaborar estratégia para retomar decisões de reintegração de posse suspensas, de maneira gradual e escalonada;

2. As comissões de conflitos fundiários devem realizar inspeções judiciais e audiências de mediação antes de qualquer decisão para desocupação, mesmo em locais nos quais já haja decisões que determinem despejos. Ministério Público e Defensoria Pública devem participar;

3. Além de decisões judiciais, quaisquer medidas administrativas que resultem em remoções também devem ser avisadas previamente, e as comunidades afetadas devem ser ouvidas, com prazo razoável para a desocupação e com medidas para resguardo do direito à moradia, proibindo em qualquer situação a separação de integrantes de uma mesma família.”

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